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     | 2021: Perspectivas para o Ano do Boi |  
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     | Não pretendemos apresentar uma previsão sobre 2021.  Gostaríamos, antes, de refletir sobre o significado de 2021 à luz da ideia de  tempo cíclico; não como uma passagem mecânica de 2020 para 2021, mas como um  processo complexo com continuidades e descontinuidades. Para esse intento,  lançaremos mão de símbolos diversos que se mostraram, de maneira mais ou menos  objetiva, presentes em 2020 e 2021. Em última análise, de parte dos símbolos  evocados, apoiamos a análise no texto do livro das mutações (WILHELM, 2006), o Yi  Jing ("I Ching"). |  
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     | Para começar, revisaremos 2020: uma pandemia histórica com  impactos muito ulteriores ao campo da saúde. Afinal de contas, o que poderia  ter significado 2020? |  
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     | 2020:  Ano do Rato – sucesso nas pequenas coisas |  
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     | 2020, segundo o horóscopo chinês, foi o ano do rato. Este animal possui  diversas conotações simbólicas, controversas até. Por exemplo: o fato de a  maioria das pessoas terem medo do animal pode ser associado às ondas de  epidemias de peste bubônica que assolaram a Ásia e a Europa a partir, pelo  menos, do século XIV (MARTIN, 2010: pp. 290-2). Além disso, o rato é um animal  famigerado, sempre com fome e sempre roendo, sinalizando para apetites vorazes  e paixões incontroláveis (CHEVALIER; GHEERBRANT, 2019: pp. 770-1). |  
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     | O rato  também se prolifera muito rápido, indicando que desejos indulgenciados em algum  momento, por pequenos que fossem, saem do controle e crescem até tornarem-se  uma praga. Gilles Deleuze e Félix Guattari (2010) diriam, a propósito do caso  do "homem dos ratos" de Sigmund Freud, que o rato pequeno é como o desejo  repulsivo, que se esconde em qualquer lugar e assim também esses desejos podem  ficar abscônditos, funcionando na maquinaria do inconsciente. |  
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     | O rato é uma  animal extremamente detalhista – qualquer um que já os teve como animal de  estimação sabe: percebem a ínfima palha que fora movida na gaiola e ficam  ciosos. Experimentos com ratos mostram grandes semelhanças entre o  comportamento deles e dos humanos – é assustador, para bem e para mal. O deus  hindu Gaṇeṣa ("Ganesha") tem por montaria um rato; é curioso, pois diz-se que  elefantes têm medo de ratos, Gaṇeṣa por outro lado não os teme e ainda toma um  deles por montaria; isto poderia ser interpretado como o desejo compreendido e  que serve como instrumento para melhora pessoal. |  
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     | Sukha (esquerda) e Dhanika (direita), companheiros do autor. |  
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     | Bastante coisas poderiam ser ditas sobre este pequeno  animal. Tendo em vista as crises econômica e política agravadas pela pandemia  de 2020, ano do rato, teríamos muito a aprender com o rato. Para este autor, o  ano do rato 2020 teria estreita correlação com uma série de hexagramas do Yi  Jing: 9. poder de domar do pequeno, 29. o abismal, 33. retirada, 38. oposição, 46.  ascensão, 62. preponderância do pequeno e 63. após a conclusão. Todos, em algum  momento mencionam, mutatis mutandis, o "sucesso nas pequenas  coisas" (WILHELM, 2006: passim). Todos os hexagramas citados têm em  comum o fato de estarem em movimento de retração, daí não ser auspicioso buscar  grandes coisas, mas sim as pequenas. E foi assim que se mostrou 2020: "é melhor  pingar do que faltar", "mais vale um pássaro na mão do que dois voando", "uma  coisa de cada vez", "cada passo em frente conta" etc. |  
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     | Os brocardos populares também suscitam a numerologia de  2020: 2+0+2+0=4. Um ano 4, portanto. O número é em si fortemente atrelado ao  mundo material – e.g.: quatro pontos cardeais, quatro estações, quatro  estados da matéria, quatro elementos, quatro fases da lua, quatro temperamentos  etc. etc. (CHEVALIER; GHEERBRANT, 2019: pp. 758-62). Esse fator material também  implica a finitude das coisas; tudo que tem um começo, tem um fim ou pelo menos  uma mutação. É assim que a semente germina, a planta cresce, floresce, produz  novas sementes e, por fim, perece. Não pensamos em 2020 como ano de finitude,  mas preferimos pensá-lo como processo. Tem etapas que deveriam ser respeitadas  e não poderiam ser puladas. Exemplo cabal disso foram as próprias quarentenas e  suas fases: relaxou-se um pouco em uma fase de alta de infecções e este número  saltou, fazendo mesmo que as fases regredissem às anteriores, mais restritivas. Parece que o rato obtém sucesso, de fato, quando se esconde  e em apanha pequenos grãos. |  
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     | Falamos em ciclo e tempo cíclico. É comum os/as ocidentais  pensarem o tempo como linear; sucessões engessadas e um fim. Os/as orientais,  por outro lado, costumam pensar o tempo como um ciclo ou círculo, pode não  prescindir das sucessões, mas comporta simultaneidades e, ao termo do ciclo,  reinicia-se (LEACH, 2010: pp. 191-209). É o princípio fundamental do daoísmo  ("taoísmo"), bem como do Yi Jing, que lhe é tributário. O que poderia ser dito,  seguindo essas premissas, sobre 2021 como sequência, mutação ou reinício? |  
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     | 2021:  Ano do Boi – trabalho sobre o que se deteriorou |  
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     | Bem, até aqui discutimos muito sobre o ano que passou. E  sobre o ano novo? 2021 será (a partir de 12-02-2021, pelo calendário chinês) o  ano do boi. Este animal pode ser mais familiar, não só porque as pessoas não  costumam temê-lo, como no caso do rato, mas também porque ele compõe o segundo  signo do zodíaco ocidental. Entre as características deste, estão a fixidez, é  feminino, frio e seco, melancólico, bestial, ponto de exaltação da Lua, exílio  de Marte, domicílio noturno de Vênus (que, aliás, é regente de 2021). Nada mal,  frente ao aprendizado difícil proposto pelo rato em 2020, parece abrir-se uma  perspectiva de acolhimento, nutrição, fortificação. Contudo, o animal parece  estar mais atrelado ao trabalho duro – pelo zodíaco ocidental, sendo fixo e de  terra, não promete moleza; a constelação lembra um arado. |  
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     | Se no caso do ano do rato tínhamos "sucesso nas pequenas  coisas", neste ano do boi teremos "trabalho sobre o que se deteriorou" (hexagrama  18)? O comentarista e tradutor Richard Wilhelm (WILHELM, 2006) explica que este  hexagrama fala do uso abusivo da liberdade e da necessidade de construir um  ponto de partida totalmente novo. Também aduz ele que os trigramas são os  mesmos, embora em ordem diversa, no hexagrama 12. estagnação, porquanto a  sensação de imobilidade também se faz presente no hexagrama 18. Este também  está intimamente associado ao hexagrama 57. a suavidade, que indica tempos em  que é auspicioso voltar ao lar, cuidar dos assuntos do país ou da casa com  delicadeza e aqui também temos "sucesso através do que é pequeno". |  
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     | A capacidade de trabalho e a ambiguidade entre um boi  (pacífico) e um touro (feroz) é assinalada também; o boi é um auxiliar, é mais  yin e contemplativo, serviria de montaria. No fundo, alude ao processo sempre  infindo de liberar o humano do animal, força para cavar os sulcos na mente para  receber as chuvas de conhecimento (CHEVALIER; GHEERBRANT, 2019: pp. 137-8). O  boi pode ser associado a um alvorecer da civilização – domesticação dos  animais, organização de uma casa e riqueza – deidades, heróis e reis de várias  culturas possuem o boi como símbolo, montaria ou recebem-no como oferenda  (MARTIN, 2010: pp. 308-11). |  
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     | Do ponto de vista da numerologia, 2021=2+0+2+1=5. Um ano 5  sói ser de avanço e estratégia, mas também ousadia, audácia, impulsividade,  extrapolação. Nada mal, contanto que seja feito uso adequado dos esforços. Já  do ponto de vista da astrologia, e aqui nos limitamos a um comentário de  passagem, os nodos lunares estão transitando por Gêmeos e Sagitário desde maio/2020  (auge da pandemia). O nodo sul, também chamado cauda do dragão ou nodo da  diminuição, está em sagitário, signo mais afim com a numerologia do 5; ao passo  que o nodo norte, cabeça do dragão ou nodo de crescimento, está em gêmeos, que  tem afinidade, antes, com pequenas coisas, pessoas e situações conhecidas, percursos  e itinerários reduzidos. Essa configuração indicaria que ainda há "lição de  casa" por fazer. |  
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     | Parece que, seguindo o raciocínio apresentado, há muito que  fazer no ciclo que está vindo, tanto em termos materiais como intelectuais. |  
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             | Referências: |  
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             | CHEVALIER,  J.; GHEERBRANT, A. Dicionário de símbolos. Rio de Janeiro: José Olympio,  2019. |  
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             | DELEUZE,  G.; GUATTARI, F. O anti-Édipo: capitalismo e esquizofrenia. São Paulo:  ed. 34, 2010. |  
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             | LEACH,  E. R. Dois ensaios a respeito da representação simbólica do tempo. In:  Repensando a antropologia. São Paulo: Perspectiva, 2010. pp. 191-209. |  
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             | MARTIN,  K. (ed.). The book of  symbols: reflections  on archetypal images. Köln: Taschen, 2010. |  
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             | WILHELM, R. I Ching: o livro das mutações. São Paulo: Pensamento,  2006 |  |  |  
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     | Shelton De Cicco Mestre em antropologia social,  acupunturista, oraculista
 shivatrabalhos@gmail.com
 www.sdcconsultasdetaro.blogspot.com
 Outros trabalhos seus no Clube do Tarô: Autores
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         | Edição: CKR  - 5/02/2021 |  
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